Apesar da indústria de dados ter se alicerçada em um ativo que não é dela – os dados pessoais – e que, muitas vezes, tem sido explorado de forma ilícita, tal modo de proceder sempre foi acompanhado de justificativas relacionadas às eficiências geradas e aos benefícios e vantagens que, de maneira “gratuita” ou acessível, são disponibilizados aos usuários, os quais muitas vezes não percebem que, ao “pagarem” pelos serviços com seus dados pessoais, são o verdadeiro produto nesse tipo de negócio.
Você já deve ter ouvido falar que se o serviço é de graça, tome cuidado, o produto pode ser você?! Então, é exatamente isso.
Percebeu-se com o tempo que os dados tanto pessoais quanto pessoais sensíveis são caros, direitos da personalidade e não havia uso adequado deles. Por isso, em tempo bastante oportuno foi publicada a Lei 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados - LGPD) para reger o tratamento dos dados das pessoas naturais com altas penalidades em caso do tratamento fora dos padrões legais.
Da mesma forma, o mercado de dados em geral cresce a partir da difusão de visões como a de que o modelo de negócios é justo, já que os usuários receberiam contrapartidas adequadas pelos seus dados, ou mesmo necessário, dado que haveria um verdadeiro trade off (escolher uma coisa em detrimento de outra) entre inovação e privacidade, de maneira que a violação desta última seria o preço a pagar ou o mal necessário para o progresso tecnológico e os novos serviços que daí decorrem. Até a forma como a questão é apresentada já reflete a perspectiva utilitarista que permeia a análise, pois se parte da premissa de que, em nome da inovação, é justificável o sacrifício de direitos fundamentais elementares.
O excesso de otimismo das próprias pessoas em relação a muitos dos modelos de negócios da economia digital e os benefícios diretos que eles lhes proporcionam, aliado às próprias dificuldades de compreensão dos seus efetivos impactos, são também fatores que criam ônus adicionais para os reguladores que, premidos entre a assimetria informacional e os benefícios das inovações, muitas vezes, não sabem o que fazer para conter esse processo e proteger minimamente os cidadãos.
Foi esse o cenário que possibilitou que vários desses negócios evoluíssem em um ambiente no qual o suposto vácuo regulatório fosse convenientemente preenchido pela autorregulação criada pelos agentes em seu próprio benefício.
Portanto, não se tem como compreender o advento da Lei Geral de Proteção de Dados brasileira senão no contexto já descrito, o que já evidencia o seu importante papel de reforçar a autonomia informativa dos titulares dos dados e o necessário e devido controle que estes precisam exercer sobre os seus dados, a fim de se colocar um freio nas vicissitudes que possibilitaram a consolidação do estágio atual da economia movida a dados.
Mais do que uma mera proteção da individualidade ou da intimidade, a tutela dos dados pessoais constitui importante medida para endereçar outros dos graves problemas decorrentes do capitalismo de vigilância, é uma mutação do capitalismo que utiliza a enorme quantidade de dados que usuários fornecem gratuitamente a empresas de tecnologias (como as que detêm redes sociais e buscadores) transformando-a em matéria-prima e produto final altamente lucrativos.
Por isso, a Lei Geral de Proteção de Dados propõe princípios rigorosos que devem ser levados em consideração pelas empresas. Caso contrário, multas e penalidades podem ser aplicadas chegando ao valor de quinhentos milhões de reais ou 2% do faturamento total da empresa.
As multas e penalizações são aplicadas após fiscalizações da Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD). Essa entidade é responsável pelo controle da atividade de tratamento de dados no Brasil. Assim, a ANPD pode exigir às empresas que lidam com informações dos usuários no meio online relatórios periódicos de como esses dados estão sendo administrados.
Lembrando que todos, tanto pessoas físicas quanto jurídicas; as que arquivam os dados no meio online quando as que ainda se utilizam de papeis e fichas, devem se adequar à nova legislação para não sofrer as punições.
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